No terceiro estado mais pobre do Brasil, quinze promotores de Alagoas levam adiante uma das maiores investigaes da histria do Ministrio Pblico Estadual contra a corrupo. O alvo a Assembleia Legislativa. Centenas de extratos bancrios, obtidos com autorizao da Justia Federal pela Lei de Acesso Informao, via Caixa Econmica Federal, mostram que a Assembleia paga a pelo menos 30 funcionrios que recebem o Bolsa Famlia, mesmo todos estando fora dos padres exigidos pelo programa; vereadores recebem salrio mesmo sem pisar na Casa; criminosos condenados pela Justia permanecem recebendo dinheiro; um dentista, que funcionrio da Casa, foi acusado, h duas semanas, de falsificar a assinatura do governador Teotonio Vilela Filho (PSDB), tentando transferir-se para a folha de pagamento da Prefeitura de Macei e requerer aposentadoria. Foi descoberto pela Controladoria Geral da Unio, que faz uma devassa em algumas contas do Executivo na capital.
Na folha h ainda donas de boutiques e celebridades de destaque nas colunas sociais locais que tm salrio sem necessidade de saber qual a funo que ocupam no Legislativo.
A maioria dos agraciados tem sobrenomes da elite alagoana. So os Brda, os Toledo, os Mello e algumas outras famlias que esbanjavam glrias no passado e hoje se esparramam na folha de pagamento da Assembleia- a maioria falidos ou casados com ricos mais recentes, cena comum na nobreza colonial.
Alguns casos chamam a ateno. Pelos extratos, h servidores que ganham trs, quatro salrios em um nico ms. Outros tinham 30 e at 51 depsitos bancrios em suas contas em um nico ano, todos autorizados pela Mesa Diretora nos ltimos trs anos. Quatorze assessores de deputados sacaram R$ 2,257 milhes no dia 3 de setembro do ano passado. Neste dia, a conta da Assembleia foi assumida- oficialmente- pela Caixa Econmica Federal. Em compensao, o banco depositou R$ 3,9 milhes para que a Casa quitasse suas dvidas trabalhistas. O dinheiro sumiu em poucos dias.
"Isso uma vergonha. Vo publicar isso no portal da Transparncia desta Casa?", perguntou o deputado Joo Henrique Caldas (PTN), o JHC, em plenrio. No houve resposta. Foi ele quem entrou com a ao na Justia Federal contra a Assembleia, aps a Mesa negar acesso aos dados financeiros do Legislativo Estadual.
"Temos na folha alguns parasitas da alta sociedade alagoana", constatou o procurador-Geral de Justia, Srgio Juc, que lidera os 15 promotores nas investigaes, ainda sem data para acabar.
JHC entregou todos os extratos bancrios ao MP e ao Tribunal de Contas. S no TC, foram abertas 23 investigaes. Em uma rpida anlise, o MP de Contas- ligado ao tribunal- descobriu 108 mil movimentaes financeiras entre 2010 e 2012. So 36 mil depsitos bancrios por ano ou quase 100 por dia. A Assembleia tem 2.200 funcionrios, menos de 300 trabalham por faltar espao no nico prdio do Legislativo, que cai aos pedaos.
So tantas irregularidades que, na semana passada, ao publicar despacho "oficializando" as investigaes, o MP de Contas esgotou as letras do alfabeto: as denncias envolvem at no recolhimento de INSS, nepotismo e distribuio sem controle de gratificaes.
"Sempre fizemos o uso dos recursos corretamente, em sintonia com a legislao. No temos dvida nenhuma de que todos os pagamentos foram feitos dentro da legalidade e que todas as acusaes sero respondidas. Tudo que foi pago na Assembleia Legislativa legal e est amparado em lei", diz o presidente da Assembleia, deputado Fernando Toledo (PSDB), que espera convocao do MP Estadual para dar explicaes. O poder faz um recadastramento de servidores. Um deles mora em Sydney, na Austrlia.
Em 6 de dezembro de 2007, a Polcia Federal estourou a Operao Taturana. Descobriu que deputados, funcionrios da Assembleia e de bancos ajudaram a desviar R$ 300 milhes- um dos maiores rombos da histria do Brasil- cinco vezes maior que o Mensalo. Deputados foram presos mas ningum foi condenado. Trs deputados federais de Alagoas so citados na fraude, alm do presidente do Tribunal de Contas de Alagoas e mais dois conselheiros do TC.
O presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, relator de uma das aes.
Os privilgios da Assembleia Legislativa de Alagoas vitaminaram a campanha do ento governador Fernando Collor ao Palcio do Planalto, em 1989. Na caa aos marajs, Collor citava o ento procurador jurdico da Assembleia, Luiz Gonzaga Mendes de Barros, acusado de criar leis para validar altos salrios na Casa. Execrado por Collor mas debochado, Barros reagiu e se deixou fotografar com uma caixa de isopor entrando na Assembleia, representando seu salrio que estava "congelado". Recebia R$ 45 mil em 1989, o dobro do teto do funcionalismo na poca. Hoje, beira dos 80 anos, o maraj tem aposentadoria de R$ 15 mil. Alguns servidores da Assembleia recebem mais de R$ 100 mil, s em gratificaes, no ano.
Fonte: Portal Terra