Marco Teixeira e Maurício Broinizi: Democratizar os tribunais de contas

Criados para auxiliar tecnicamente o Legislativo no controle da gesto financeira dos governos e demais rgos do Estado brasileiro, os tribunais de contas vm ganhando notoriedade de maneira ambgua.

Ora por revelarem problemas de m gesto de recursos pblicos, ora por alguns dirigentes se envolverem em decises que os beneficiam ou em rede de interesses que fraudam contratos e licitaes.

Duas questes permeiam essa ambiguidade. Como tornar os tribunais de contas mais acessveis? E como garantir que estejam inteiramente voltados para o atendimento do princpio republicano do zelo pela coisa pblica, que deveria orientar suas aes, equilibrando vises tcnicas e polticas em suas decises?

J existem experincias de ouvidorias e de processos de capacitao da populao para o entendimento das contas governamentais conduzidos por tribunais de contas. Tais iniciativas tm colaborado para que, de um lado, se possa contar com os cidados como atores pblicos importantes no controle da ao governamental e, de outro, seja possvel aperfeioar constantemente o trabalho dos tribunais de contas por meio de crticas da sociedade.

No foram poucas as denncias provenientes da sociedade que levaram o Tribunal de Contas da Unio (TCU) e tambm alguns Tribunais de Contas Estaduais (TCE) a iniciarem auditorias que acabaram por responsabilizar maus gestores pblicos.

Isso nos leva a perguntar por quais razes o TCE de So Paulo e o Tribunal de Contas do Municpio de So Paulo ainda no criaram ouvidorias ou estruturas semelhantes que permitam um ciclo completo de interao com a sociedade.

Tambm se faz necessrio o cumprimento da Lei de Acesso Informao, que define que os relatrios de auditoria so documentos pblicos e devem ser disponibilizados de forma ativa para consulta antes mesmo do julgamento final da matria.

A questo sobre como garantir o zelo pela coisa pblica nos remete a um problema central na estrutura dos tribunais de contas: a composio do seu corpo dirigente. Um tero indicado pelo Executivo (para cada trs, dois so recrutados entre auditores substitutos de conselheiros e membros do Ministrio Pblico de Contas - MPC) e dois teros pelo Legislativo, sendo que todos precisam ser aprovados pelos parlamentares. Todavia, apenas recentemente o TCE-SP, aps ter sido obrigado judicialmente, iniciou a incluso de auditores e membros do MPC em seu conselho. O TCM-SP tem um corpo dirigente puramente poltico (quatro ex-vereadores e um ex-secretrio de governo).

No que um conselho eminentemente poltico indique que os trabalhos sero enviesados. Entretanto, necessria a adoo de um mecanismo de pesos e contrapesos. A atuao dos representantes de carreira com assentos no colegiado seria um importante contraponto tcnico.

A condenao de Paulo Maluf por superfaturamento na construo do tnel Ayrton Senna, confrontada com a aprovao de suas contas pelo TCM-SP, d margem para inmeros questionamentos.

No TCM-SP, est em curso a abertura de uma vaga para o seu corpo dirigente. Independentemente de quem seja a responsabilidade pela indicao para ocupar o posto, o momento propcio para o debate.

Fernando Haddad, que ganhou notoriedade por botar o combate corrupo na agenda de seu governo, poderia se colocar frente da discusso para que a indicao dos conselheiros tambm passe a ser pautada por critrios tcnicos, e no mais apenas pela convenincia poltica de momento.

Qualquer rgo pblico deve ter o cidado como principal cliente, o que no se tem visto de maneira adequada no TCM-SP. Se no caminharmos nessa direo, a lgica das indicaes polticas prevalecer mais uma vez. Vereadores candidatos a conselheiros que no faltam.

MARCO ANTONIO CARVALHO TEIXEIRA, 49, cientista poltico e professor de administrao pblica da Fundao Getulio Vargas de So Paulo

MAURCIO BROINIZI PEREIRA, 51, doutor em histria econmica pela USP, coordenador da secretaria-executiva da Rede Nossa So Paulo

Fonte: Folha de So Paulo